Clássico que coloca frente a frente as duas maiores torcidas do Rio de Janeiro, o encontro entre Flamengo e Vasco não tem sido exatamente equilibrado recentemente. Por mais que um jogo desse porte raramente tenha um franco favorito, fato é que a rivalidade tem sido dominada pelo lado rubro-negro dentro das quatro linhas. Hoje, os adversários duelam às 17h45, no Nilton Santos, pelo jogo de ida da semifinal do Campeonato Carioca.
Nas últimas 30 vezes em que Flamengo e Vasco se enfrentaram, o cruz-maltino venceu apenas duas. Tal diferença fez surgir o questionamento: é possível que o retrospecto recente faça diminua a importância da rivalidade num confronto de tamanha relevância estadual e nacional?
— A rivalidade sempre vai existir, nunca vai acabar. O que acontece é que o Flamengo se organizou desde a época do Bandeira (ex-presidente Eduardo Bandeira de Mello), e o Vasco só vem em decadência — analisa o ex-atacante Luizão.
Campeão da Libertadores de 1998 pelo Vasco e da Copa do Brasil de 2006 pelo Flamengo — justamente contra o cruz-maltino — e com gols em ambas as finais, o ex-centroavante aponta o Clássico dos Milhões como o mais importante do Rio:
— Era maravilhoso, gostoso demais jogar esse clássico. Flamengo e Vasco é diferente.
Apesar do Flamengo ter, de fato, iniciado sua reconstrução financeira no início do mandato de Bandeira de Mello em 2013, mesma temporada em que o Vasco foi rebaixado para a Série B pela segunda vez em sua história, os anos que sucederam a isso foram de superioridade do Vasco. De 2015 até 2017, o cruz-maltino chegou a ficar nove jogos sem perder para o rubro-negro, com seis vitórias e três empates.
Foi a partir de um confronto pelo Carioca de 2017, justamente num sábado de carnaval, que a maré virou para o lado rubro-negro. Com gol de Diego Ribas, o Flamengo venceu o Vasco por 1 a 0, em Volta Redonda, e, de lá para cá, só foi derrotado pelo cruz-maltino uma vez em 2021 e outra em 2023. A disparidade de vitórias nesse recorte é a maior entre os principais clássicos do país.
— Acho que isso é o campo refletindo o extracampo em vários aspectos. Da instabilidade política, administrativa e gerencial (do Vasco) à questão econômica que se reflete na qualidade dos elencos. De 2008 para cá, quantas vezes o Vasco foi rebaixado, quantas disputas políticas teve em que o clube se corroía por dentro por causa da divisão interna... Como foi infeliz o processo de venda do clube, que culminou na necessidade de recuperação judicial e da retomada do controle da SAF pela associação com pouca capacidade de atrair receita — diz Carlos Eduardo Mansur, colunista do GLOBO e comentarista do Sportv.
De acordo com o jornalista, as adversidades vividas pelo Vasco nas últimas duas décadas tiveram reflexo na profunda crise econômica vivida pelo clube, com alto endividamento. A consequência disso foi, naturalmente, a fragilização do futebol.
— Enquanto isso, o Flamengo fez um caminho inverso. Teve erros em projetos esportivos, mas é um clube com muito mais pujança e capacidade de atrair jogadores no mercado, por conta do nível de receita hoje muito acima do Vasco — conclui Mansur, que acredita ser possível o cruz-maltino eliminar o rival rubro-negro no Estadual, mas não enxerga como plausível um desempenho melhor de maneira “sólida e constante”.
Embora seja difícil ver, num futuro próximo, uma mudança no cenário técnico entre Flamengo e Vasco, pesquisadores e escritores ligados a ambos os clubes entendem que, ainda assim, o clássico seguirá como um dos mais importantes do Brasil.
— Entre 1945 e 1951, a equipe vascaína que ficou conhecida como Expresso da Vitória alcançou a maior série invicta da história do clássico, com 20 partidas sem derrota para o rival. Oitenta anos depois, em 2025, sabemos que de lá pra cá a rivalidade apenas aumentou e que a suposta “crise” (no clássico) dos anos 40 e 50 não extrapolou os limites geracionais dos torcedores da época — aponta Bruno Pagano, autor do livro “Russinho: o inigualável êxtase do gol”, sobre o histórico artilheiro cruz-maltino da década de 1920.
— Quem começou a torcer dentro desse recorte de 30 jogos não deve ver sentido nenhum em considerar o Vasco rival. Mas em uma consideração histórica, tem rivalidade — conclui o também historiador e escritor Maurício Neves de Jesus.
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