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O papel de cada um na tentativa de golpe, segundo a PF

Por G1    Quinta-Feira, 21 de Novembro de 2024


Além do ex-presidente Jair Bolsonaro, entre os indiciados pela Polícia Federal no inquérito que apura suspeitas de tentativa de golpe no país estão ainda ex-ministros, ex-assessores e políticos de seu entorno. Ao todo, são 37 indiciados, incluindo os ex-ministros Walter Braga NettoAugusto HelenoAnderson Torres, o ex-diretor da Abin Alexandre Ramagem, o ex-assessor da Presidência Filipe Martins e o presidente do PL, Valdemar Costa Netto.

A PF afirma que o grupo ligado a Bolsonaro se dividiu em seis núcleos para organizar uma tentativa de golpe de Estado, como "Desinformação e Ataques ao Sistema Eleitoral", "Núcleo Jurídico" e "Inteligência Paralela". A relatoria está com o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes.

Veja abaixo a lista dos indiciados e o papel de cada um.

 

Jair Bolsonaro

 

De acordo com a PF, há "dados que comprovam" que Bolsonaro participou ativamente do processo de elaboração e tentativa de execução do golpe. Além disso, o então presidente "analisou e alterou uma minuta de decreto que, tudo indica, embasaria a consumação do golpe de Estado em andamento".

Bolsonaro ainda não se manifestou após o indiciamento, mas em outras ocasiões negou que tenha participado de uma tentativa de ruptura institucional. Em entrevista ao GLOBO há duas semanas, ele disse que houve debates sobre a decretação de um estado de sitio no país, mas afirmou que “não é crime discutir a Constituição”.

Um dos elementos obtidos pela investigação foi a confirmação de um encontro entre Bolsonaro e o então comandantes das Forças Armadas em dezembro de 2022 no qual foram apresentadas ações que possibilitariam um golpe. O ex-comandante do Exército Freire Gomes disse em depoimento à PF que, no encontro, Bolsonaro detalhou a possibilidade de "utilização de institutos jurídicos" como Garantia da Lei e da Ordem (GLO), Estado de Defesa ou Estado de Sítio para impedir a posse de Lula.

Segundo Gomes, ele e o ex-comandante da Aeronáutica Carlos de Almeida Baptista Junior adotaram uma postura contra a proposta, enquanto o comandante da Marinha, Almir Garnier Santos “teria se colocado à disposição do presidente da República”. Conforme Baptista Junior, Freire Gomes chegou a ameaçar Jair Bolsonaro de prisão, caso o então presidente prosseguisse com o plano de golpe de Estado.

Outro elemento citado na investigação é uma reunião com teor golpista em julho de 2022 no Palácio do Planalto com integrantes do primeiro escalão do governo. Na ocasião, Bolsonaro incitou uma ação antes das eleições, e foi seguido por alguns minutos na fala pró-golpe.

A PF também incluiu em seu relatório final do inquérito do golpe que há indícios que Bolsonaro sabia do plano para matar o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o vice-presidente, Geraldo Alckmin, e o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), em 2022.

Relatório que trata sobre o plano para matar Lula, Alckmin e Moraes afima que o documento com o planejamento, batizado de "Punhal verde amarelo", foi impresso no Palácio do Planalto pelo então número 2 da Secretaria-Geral da Presidência, general Mario Fernandes. A investigação aponta que, em 16 de dezembro de 2023, o militar fez seis cópias do arquivo que, para os investigadores, indica que seriam distribuídas em uma reunião.

Registros de entrada do Palácio da Alvorada do dia seguinte, 17 de dezembro, mostram que Mario Fernandes foi um dos visitantes da residência oficial da Presidência, onde Bolsonaro ficou recluso após perder as eleições para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. No mesmo dia, o ex-assessor especial Filipe Martins, que, segundo a delação de Cid foi um dos mentores de uma minuta golpista, também esteve no local no mesmo dia.

 

Walter Braga Netto

 

Ex-ministro da Defesa e da Casa Civil, e candidato a vice na chapa à reeleição de Bolsonaro, o general da reserva teria atuado na incitação contra membros das Forças Armadas que não aderiram à tentativa de golpe. Mensagens mostram que ele ordenou críticas aos então comandantes do Exército, Marco Antônio Freire Gomes, e da Aeronáutica, Carlos de Almeida Baptista Júnior. No dia da operação, afirmou ao GLOBO que "é tudo uma invenção, um sonho".

Além disso, a casa de Braga Netto foi usada para reunião no dia 12 de novembro de 2022 na qual, segundo a PF, foi discutido o plano para matar Lula, Alckmin e Moraes. De acordo com a investigação, o monitoramento do ministro do STF começou a ser feito “logo após a reunião”.

Também depois desse encontro, os investigadores descobriram que os militares à frente do plano compartilharam um documento com uma estimativa de gastos para “possivelmente viabilizar as ações clandestinas que seriam executadas”.

As investigações identificaram ainda que o grupo alvo da operação previa que Braga Netto e o ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) Augusto Heleno ficassem no comando de um "gabinete de crise". Documentos apreendidos pelos investigadores apontam que a ideia era que esse gabinete fosse formado imediatamente após os assassinatos serem concretizados.

A Polícia Federal também aponta Braga Netto como elo entre o ex-presidente e integrantes dos acampamentos montados em frente aos quartéis do Exército que pediam intervenção militar após a vitória de Lula. A apuração tem como base a delação premiada do ex-ajudante de ordens Mauro Cid. De acordo com o relato dele à PF, Braga Netto costumava atualizar Bolsonaro sobre o andamento das manifestações golpistas e fazia um elo entre o ex-presidente e integrantes dos acampamentos antidemocráticos. A defesa do ex-ministro afirmou que não iria comentar, pois ainda não teve acesso às investigações.

 

Augusto Heleno

 

O ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional afirmou, em reunião ministerial, que se "tiver que virar a mesa é antes das eleições" e que era necessário agir "contra determinadas instituições e contra determinadas pessoas". Também relatou ter discutido um plano para infiltrar agentes da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) em campanhas eleitorais.

Além disso, as investigações sobre o plano de matar Lula, Alckmin e Moraes incluia a instalação de um "Gabinete de Crise" que teria Heleno no comando, com Braga Netto como "coordenador-geral". Documentos apreendidos pelos investigadores apontam que a ideia era que esse gabinete fosse formado imediatamente após os assassinatos serem concretizados. Heleno não tem se manifestado sobre as acusações.

 

 

Valdemar Costa Neto

 

Presidente do PL, partido de Bolsonaro, o ex-deputado passou a ser alvo da Polícia Federal após o PL entrar com uma ação no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) na pedia anulação de parte dos votos das eleições de 2022. A investigação aponta que o PL foi usado “para financiar a estrutura de apoio as narrativas que alegavam supostas fraudes às urnas eletrônicas, de modo a legitimar as manifestações que ocorriam em frentes as instalações militares".

Segundo a PF, o ápice da estratégia ocorreu no dia 22 de novembro de 2022, quando a coligação formada pelo PL, Republicanos e Progressistas entrou com uma ação que, na prática, anularia votos de urnas utilizadas nas eleições daquele ano. Sobre isso, a PF aponta que apesar de o questionamento formal sobre as urnas ter partido da coligação, Valdemar era o "principal fiador dos questionamentos".

Conforme a PF, dentro da divisão de tarefas estabelecidas por um dos núcleos da organização, chamado de "núcleo de desinformação e ataques ao sistema eleitoral", coube a Valdemar Costa Neto "financiar, divulgar perante a imprensa e endossar a ação judicial que corroborava a atuação da rede de ‘especialistas’ que subsidiaram ‘estudos técnicos’ que comprovariam supostas fraudes nas eleições presidenciais de 2022”.

Segundo os investigadores, o antigo comitê da campanha de Bolsonaro, alugado pelo PL, chegou a ser usado pelos investigados. O local, de acordo com a PF, ficou conhecido como "QG do golpe", pelo fato de ter sido frequentado, após o término do segundo turno das eleições, "por diversos apoiadores do então presidente Jair Bolsonaro entusiastas de uma intervenção militar das Forças Armadas que resultaria na continuidade do então presidente no poder".

Valdemar chegou a ser preso em flagrante em uma das operações da PF por posse ilegal de arma e usurpação de bens da União (devido a uma pepita de ouro sem origem declarada).

 

 

Anderson Torres

 

Ex-ministro da Justiça de Bolsonaro, Torres foi preso pela PF após os ataques de 8 de janeiro, quando golpistas invadiram o Congresso, o Palácio do Planalto e do STF. Na época secretário de Segurança Pública do Distrito Federal, ele foi responsabilizado por não ter montado um esquema de policiamento capaz de impedir as invasões. O então secretário havia deixado o país na véspera.

No ano passado, foi encontrada em sua casa a minuta de um decreto que previa uma espécie de intervenção no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) após as eleições. O documento era datado de 2022, com dia e mês em branco, e o nome de Bolsonaro. O texto não estava assinado e nunca chegou a virar decreto oficial.

A PF descobriu que, quando a minuta foi encontrada, houve "intensa comunicação entre parte dos investigados em tom de preocupação", o que indicaria o conhecimento sobre o documento. Anderson Torres afirmou que o documento é um "texto apócrifo" que seria descartado.

 

Filipe Martins

 

Ex-assessor de Assuntos Internacionais da Presidência, Filipe Martins foi preso na casa de sua namorada, em Ponta Grossa (PR), no dia 8 de fevereiro deste ano. Segundo a PF, ele foi responsável por levar ao ex-mandatário uma minuta golpista que previa a prisão de autoridades, entre elas o ministro do STF Alexandre de Moraes, e a realização de novas eleições.

A trama golpista, segundo o inquérito, teria envolvido a entrega da minuta e a preparação para realizar um golpe de Estado “com apoio de militares com conhecimentos e táticas de forças especiais em ambiente politicamente sensível".

De acordo com o relato da delação premiada de Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, Martins elaborou a suposta minuta golpista após o resultado das eleições em 2022. De acordo com informações levantadas pela PF, o ex-assessor esteve no Alvorada nos dias 18 de novembro e 16, 20 e 21 de dezembro de 2022.

O ex-assessor presidencial nega tenha atuado para elaborar uma minuta golpista.

 

Alexandre Ramagem

 

Único parlamentar na lista de indiciados, o deputado federal Alexandre Ramagem (PL) comandou um esquema de espionagem clandestina na Agência Brasileira de Inteligência (Abin) , órgão que dirigiu no período em que Bolsonaro era presidente. Na ocasião, segundo as apurações, um sistema israelense foi usado para espionar ilegalmente autoridades dos Três Poderes da República. O uso da ferramenta FirstMile pela Abin foi revelado pelo GLOBO em março de 2023, o que levou a PF a abrir uma investigação. Ramagem nega irregularidades.

Além disso, O GLOBO revelou documentos registrados em seu e-mail com orientações para Bolsonaro sobre temas sensíveis. Os textos dos arquivos traziam, entre outras recomendações, ataques às urnas eletrônicas e à lisura das eleições, além de relatos difamatórios sobre ministros do Supremo Tribunal Federal (STF).

Em um dos textos, guardados em formato de word no arquivo "Presidente TSE informa.docx" há uma orientação para traçar uma estratégia de reforçar politicamente a "vulnerabilidade" das urnas eletrônicas. "Por tudo que tenho pesquisado, mantenho total certeza de que houve fraude nas eleições de 2018, com vitória do sr. (presidente Bolsonaro) no primeiro turno. Todavia, ocorrida na alteração de votos", destaca o documento encontrado no e-mail de Ramagem.

O texto do arquivo passa, então, a sugerir a Bolsonaro que mine a confiança das urnas eletrônicas com informações comprovadamente falsas e sem fundamento. No arquivo encontrado com Ramagem, há ainda a descrição de que foi constituído um grupo de confiança para "trabalho de aprofundamento da urna eletrônica" — que contaria com a ajuda do major da reserva do Exército Angelo Martins Denicoli, investigado por integrar um suposto plano golpista. O ex-chefe da Abin disse, porém, que não se lembrava desse fato e que não efetuou nenhum trabalho com o militar mencionado no documento.

A investigação envolvendo o caso Abin tem se cruzado, segundo a PF, com o inquérito dos atos golpistas, que resultou, na tarde de hoje, no indiciamento do parlamentar.

 

Almir Garnier

 

Em reunião com Bolsonaro, o então comandante da Marinha teria sido o único chefe de uma Força a encampar o plano golpista de manter Bolsonaro no poder. De acordo com a delação de Cid, o almirante teria dito ao ex-presidente, em reunião no Palácio da Alvorada, que a sua tropa estava pronta para atender a um chamamento. Naquela ocasião, o comando do Exército não embarcou na trama.

Segundo a PF, Garnier fazia parte de um núcleo de oficiais que "teria se utilizado da alta patente militar por eles detida para influenciar e incitar o apoio aos demais núcleos de atuação, por meio do endosso de ações e medidas a serem adotadas, para a consumação do golpe de Estado".

Em mensagem enviada a interlocutores em fevereiro, após ser alvo de uma operação da PF, ele afirmou: "Peço a todos que orem pelo Brasil e por mim. Continuamos juntos na fé, buscando sempre fazer o que é certo, em nome de Jesus".

Em outubro do ano passado, Garnier também foi alvo de indiciamento no relatório da CPI do 8 de Janeiro pelos crimes de associação criminosa, abolição violenta do Estado Democrático de Direito e golpe de Estado.

A relatora da CPI, senadora Eliziane Gama (PSB-MA), afirmou que ele "aderiu" ao plano golpista e "colaborou decisivamente" para o "desfecho" dos atos antidemocráticos, quando manifestantes bolsonaristas invadiram e depredaram as sedes dos Três Poderes.

 

Paulo Sérgio Nogueira

 

De acordo com a PF, Nogueira, ex-ministro da Defesa, manipulou o relatório da pasta sobre o sistema eleitoral, postergando a divulgação depois que não foram identificadas vulnerabilidades nas urnas eletrônicas. Em reunião ministerial, disse que estava "na linha de contato com inimigo" em comissão do TSE e que o grupo seria "para inglês ver". A defesa de Paulo Sérgio tem afirmado que o ex-ministro "sempre agiu corretamente, é inocente e confia na Justiça".

 

José Eduardo de Oliveira e Silva

 

A PF aponta que o padre José Eduardo de Oliveira e Silva participou de reuniões com Bolsonaro para discutir propostas de impedir a posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva no fim de 2022. Entre as alternativas, segundo as investigações, estavam a decretação do estado de sítio, prisão de autoridades e realização de novas eleições.

Em depoimento à PF, o padre negou ter participado qualquer reunião no Palácio do Planalto com conotação política ou que tenha sido discutida a minuta golpista. Segundo o religioso, ele se encontrou com Bolsonaro apenas para prestar "apoio espiritual" a ele.

A presença de um padre em encontros sobre o suposto plano golpista foi citada pelo tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, que fechou acordo de delação premiada com a PF.

 

Marcelo Costa Câmara

 

Ex-assessor de Bolsonaro, o coronel da reserva é suspeito de ter monitorado de forma ilegal o ministro Alexandre de Moraes. Câmara trocou mensagens com o tenente-coronel Mauro Cid detalhando um itinerário de voos que, posteriormente, a PF descobriu que coincidia com os trajetos feitos por Moraes no período (dezembro de 2022). O advogado Eduardo Kuntz disse que ele sempre atuou "de forma legítima e com instrumentos lícitos".

 

Tércio Arnaud

 

Também ex-assessor de Bolsonaro, é apontado como integrante do grupo conhecido como "gabinete do ódio". Teria auxiliado na produção, divulgação e amplificação de notícias falsas sobre o processo eleitoral. Ele tem alegado inocência.

 

Ronald Ferreira Junior

 

Tenente-coronel do Exército, teria atuado na elaboração de uma minuta de decreto que embasaria um golpe de Estado. Segundo a PF, as investigações demonstram que ele tinha posse de documentos que seriam complementos da suposta minuta golpista. Ele ainda não se manifestou sobre as investigações.

 

Bernardo Romão Correa Netto

 

Preso pela PF em Brasília após voltar de missão nos Estados Unidos, o coronel do Exército é apontado pela PF como o organizador de uma reunião de oficiais das Forças Especiais do Exército para discutir a trama golpista em 28 de novembro de 2022. Correa Netto era assistente do Comando Militar do Sul e apontado como homem de confiança do tenente-coronel Mauro Cid. O militar ainda não se manifestou sobre o caso.

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