O projeto aprovado na Câmara cria uma “Associação Interfederativa para a Cooperação no Enfrentamento ao Crime Organizado Transnacional”, mas deixa na mão dos estados as decisões do órgão.
Em semana decisiva para a aprovação do pacote fiscal, a Câmara dos Deputados optou por outro caminho e se debruçou sobre pautas voltadas para a segurança pública, encabeçadas por parlamentares ligados a forças de segurança, a favor do armamento e de oposição ao governo.
Na lista de projetos aprovados estão temas polêmicos, como castração química para pedófilos, anistia a portadores de armas ilegais, internações compulsórias e um texto que enfraquece governo federal e fortalece estados no combate às facções criminosas.
Segundo o colunista do g1 Valdo Cruz, deputados bolsonaristas 'fizeram a festa' em semana de votação de projetos sobre segurança pública.
As propostas ganharam os holofotes nesta semana ao ocupar o espaço das medidas propostas pelo Executivo para garantir o equilíbrio das contas públicas, em um momento de crise do Congresso com o governo por causa das emendas parlamentares (entenda mais no vídeo abaixo).
Veja detalhes das matérias aprovadas:
A proposta determina a castração química de pessoas condenadas por crimes sexuais contra menores de idade. Foram 267 votos favoráveis à castração química, ante 85 contrários.
O texto foi aprovado depois de uma mobilização de oposicionistas, que incluíram a punição em um projeto que tratava somente da criação de um cadastro nacional de pedófilos.
🔎O procedimento de castração é realizado com medicamentos inibidores de libido a fim de privar o paciente de impulsos sexuais.
Segundo o projeto, a castração química será uma punição aplicada de forma conjunta às penas de reclusão ou detenção para uma série de crimes de cunho sexual contra crianças e adolescentes.
A medida valerá para criminosos condenados após o trânsito em julgado – quando não há mais possibilidade de recurso — em crimes como:
🔎De acordo com o texto, a castração química aplicada aos condenados definitivos será realizada por meio de medicamentos, seguindo um futuro regramento editado pelo Ministério da Saúde.
Em maio deste ano, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado também aprovou projeto semelhante. O texto foi enviado à Câmara, mas até hoje não avançou na Comissão de Saúde da Casa.
Prisão — Foto: Reprodução/EBC
O projeto permite a juízes aplicar a pessoas inimputáveis períodos de 20 anos de internação, amplia a utilização de internações compulsórias e dificulta a ressocialização desse grupo de pessoas.
🔎Pessoas inimputáveis são aquelas que, pela lei, não podem ser consideradas responsáveis por seus atos devido a doenças mentais ou distúrbios psicológicos.
Conforme o projeto, a internação, ou tratamento ambulatorial, será por tempo indeterminado, com prazo mínimo de 3 a 20 anos. Hoje, o mínimo é de 1 a 3 anos.
O projeto, de autoria do ex-deputado Delegado Waldir (União-GO), ainda estabelece período mínimo de internação de:
Os prazos foram considerados excessivos por parlamentares governistas, que argumentaram que as mudanças comprometem o caráter indeterminado das medidas de segurança.
O projeto impõe também condições restritivas para a desinternação ou substituições da medida de segurança.
Pelo texto, isso só será possível após o cumprimento dos prazos mínimos de internação e à realização de perícias a cada três anos. Hoje, a perícia é anual ou a qualquer tempo.
Segundo os deputados, isso contradiz os princípios da reforma psiquiátrica, que incentiva medidas alternativas à internacionalização e a reinserção social como eixo central do tratamento.
Um dos pontos mais criticados por deputados governistas é a obrigatoriedade de internações em "unidades especializadas de custódia" ou em “estabelecimentos de saúde que forneçam serviços de atenção à saúde mental”.
Segundo os parlamentares, o trecho reforça a institucionalização e contraria o princípio da desinstitucionalização, que visa integrar essas pessoas à sociedade.
Outro texto aprovado favorece os estados no combate transnacional de facções criminosas.
O texto, votado durante a semana em que a Câmara se dedicou a projetos de segurança pública, foi apresentado dois dias antes de o governo fazer uma reunião com governadores no Palácio do Planalto para apresentar a PEC da Segurança, que tem por objetivo empoderar a União no combate ao crime organizado.
🔎Atualmente, o governo federal é responsável por ações de defesa nacional (Forças Armadas), enquanto a maior parte das atribuições de segurança cabe aos governos estaduais com suas polícias civis e militares.
A PEC quer aumentar essa participação. A intenção do governo é integrar as polícias, reforçar o Sistema Único de Segurança Pública (SUSP) e aumentar as responsabilidades da União.
O projeto aprovado na Câmara cria uma “Associação Interfederativa para a Cooperação no Enfrentamento ao Crime Organizado Transnacional”, mas deixa na mão dos estados as decisões do órgão.
Conforme o texto, as deliberações sobre as decisões do órgão serão tomadas por três quintos dos votos dos membros do órgão colegiado, considerada a seguinte ponderação de votos: 49% atribuídos à União e 51% divididos entre os Estados e o Distrito Federal.
A proposta também cria a Regra de Isenção de Providência Antecipada (Ripa), que na prática estabelece excludentes de ilicitudes para agentes infiltrados no combate a facções criminosas.
Segundo o Ministério da Justiça, a proposta viola o Pacto Federativo e o princípio da legalidade ao prever que os agentes de segurança pública possam cometer qualquer tipo de conduta ilícita em função da operação.
Nessa quarta-feira (11), a câmara aprovou projeto que autoriza investigados a registrarem armas.
O texto retira do dispositivo que regulamenta o registro de arma de fogo a obrigação de o interessado declarar a efetiva necessidade e permite que pessoas que respondem a inquérito policial registrem armas de fogo.
Atualmente, o Estatuto do Desarmamento proíbe isso. Segundo a legislação, quem quer ter arma de fogo não pode estar respondendo a inquérito policial ou a processo criminal.
Especialistas em segurança pública identificaram, no meio do pacote da Câmara, uma proposta patrocinada pela bancada da bala, que, nas palavras dos estudiosos "desmonta o estatuto do desarmamento" e "concede anistia para quem desde 2008 tem arma ilegal".
O projeto aprovado, no entanto, elenca os crimes pelos quais uma pessoa investigada será proibida de registrar armas e, na prática, libera para os demais.
“O texto tem vários crimes que havendo inquéritos a pessoa não pode registrar armas de fogo. Isso é avanço. Mas quantos outros crimes não estão neste artigo e mesmo pessoas com inquérito poderão ter armas de fogo? Isso é problemática”, afirmou o deputado Pastor Henrique Vieira (PSOL-RJ).
Conforma a proposta, não poderão ter armas pessoas que forem condenadas, por qualquer crime, ou que estejam respondendo a inquéritos por:
Além disso, pessoas sob restrição por medida protetiva também não poderão registrar armamentos.
O projeto estende de 3 para 5 anos a validade do registro de armas de fogo, dilatando portando os prazos para revisão dos dados do portador.
Além disso, o texto reabre o prazo para legalização de armas irregulares. Esta janela está fechada desde 31 de dezembro de 2008. Atualmente, quem ainda ostenta armamento não regularizado está com porte ou posse ilegal.
Segundo a proposta, quem tiver arma de fogo ainda não registrada ou com o registro vencido poderá solicitar seu registro em até um ano a partir da publicação da lei.
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