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Hugo Motta angaria ampla maioria e terá desafio de acomodar interesses divergentes dos partidos

Por O Globo    Sexta-Feira, 1 de Novembro de 2024


Com um amplo arco de apoios que vai do PL, partido do ex-presidente Jair Bolsonaro, ao PT, do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o deputado Hugo Motta (Republicanos-PB) conseguiu ontem o apoio informal do União Brasil, partido do seu principal adversário na disputa para a presidência da Câmara, Elmar Nascimento (BA). Motta tem agora o desafio de acomodar pautas e pedidos por espaços em uma futura Mesa Diretora da Casa. Apesar de ter sido preterido pelo próprio partido, Elmar insiste na candidatura para suceder Arthur Lira (PP-AL).

O baiano se encontrará no sábado com o presidente nacional do PSD, Gilberto Kassab, e com o líder do partido, Antonio Brito (BA), que também segue na disputa. A expectativa é que apenas um deles siga no páreo. Em uma movimentação paralela à do União Brasil, que minou os planos de Elmar, Lira convocou a bancada do PSD para uma reunião na noite de quarta-feira. Aos deputados presentes, ele teria pedido para que apoiassem Motta. De acordo com os presentes, Lira teria se comprometido a dialogar com o governo para aumentar o espaço dos pessedistas na Esplanada dos Ministérios. A aliados, entretanto, Brito nega a possibilidade de barganha para desistir de concorrer.

Maioria formada — Foto: Editoria de Arte
Maioria formada — Foto: Editoria de Arte

Dentro do União Brasil, a avaliação é que Motta, que já recebeu o apoio do PP e de Lira, e teve confirmados os endossos do PT, PL, MDB, Podemos, PV e PCdoB, é o favorito para comandar a Casa e não há meios de concorrer contra ele. Antes mesmo de fechar com o União Brasil, Motta já tinha um arco de aliança partidária que somava 318 deputados, o suficiente para ser eleito — que é maioria absoluta de 257 votos.

 

Rateio de cargos

 

O partido de Elmar teme ficar escanteado na partilha de espaços da Casa, se for para um confronto. Caso o União Brasil fique fora do bloco de apoio a Motta, o partido não assumirá a presidência da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Casa, o que está previsto para 2025 ou 2026, por acordo firmado no ano passado.

Na ocasião, ficou acertado que os partidos com maiores bancadas pertencentes ao bloco que elegeu Lira se alternariam ano a ano à frente do colegiado mais importante da Casa. Como o PT exerceu a presidência no primeiro ano de governo e o PL comanda a CCJ atualmente, as duas futuras presidências seriam ocupadas por MDB e União Brasil. Com Motta fortalecido, Elmar não escondeu a mágoa com Lira, que desistiu de apoiá-lo:

— Já cheguei muito mais longe do que achava que poderia chegar. Nesse processo, eu já comecei perdendo, perdi um amigo que eu considerava meu melhor amigo, o presidente Arthur Lira.

Elmar, que tenta resistir a pressões externas e do seu próprio partido para desistir de concorrer, também afirmou que conversará com Motta:

— Me mantenho candidato. Essa deliberação do partido nos delegou carta branca para, junto do presidente (Antônio) Rueda, e do vice-presidente ACM Neto, para que a gente possa ter essas conversas. Tem também uma conversa agendada com o presidente (do PSD) Kassab, para ver como a gente encaminha. Vamos ouvi-lo e também vamos encontrar com o candidato Antonio Brito, com quem nós fizemos um pacto de apoio recíproco no segundo turno. Fruto dessas conversas poderá haver algum tipo de avanço.

Líderes partidários dizem que o PL, maior partido da Câmara, com 93 deputados, indicará a primeira vice-presidência da Casa, e o PT, segunda maior bancada, vai ficar com a primeira-secretaria, que funciona como uma espécie de prefeitura. A terceira pedida por um cargo na Mesa Diretora deve caber ao PSD ou ao União Brasil, que também mira a CCJ.

Já a relatoria do Orçamento é alvo de uma disputa entre MDB e União Brasil. O partido de Elmar pediu para indicar o relator do Orçamento em troca da retirada da candidatura e o apoio ao líder do Republicanos. Apesar disso, a expectativa é que o cargo fique com o MDB.

O candidato do Republicanos, que tem o apoio do PT do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e do PL de Jair Bolsonaro, tenta fugir da polarização. Ele evita se posicionar sobre pautas relacionadas aos costumes, como aborto e a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que criminaliza o porte de qualquer quantidade de droga. O paraibano também não disse se é a favor ou contra a anistia aos envolvidos nos atos golpistas do 8 de Janeiro.

 

Trajetória legislativa

 

Em 2015, durante a gestão de Eduardo Cunha no comando da Câmara, Motta foi um dos votos favoráveis ao projeto que reduz a maioridade penal de 18 para 16 anos — pauta que contraria a esquerda. O texto foi aprovado pelos deputados, mas foi engavetado no Senado.

Já sobre a iniciativas econômicas, o deputado do Republicanos se posicionou a favor de projetos relacionados à contenção fiscal, como o teto de gastos durante o governo Temer e o arcabouço fiscal na gestão Lula. Ele também foi favorável à Reforma Tributária, à autonomia do Banco Central e relatou a PEC do Orçamento de Guerra, que instituiu uma verba emergencial durante a pandemia de Covid-19. Durante evento em que o PV anunciou apoio a ele, Motta disse que quer focar “nos problemas reais” do país:

— O nosso dever e a nossa tarefa será, sempre ouvindo o colégio de líderes, ouvindo os partidos, montarmos uma pauta positiva para o Brasil, discutimos aqui os reais e graves problemas que a nossa população tem. Podermos fazer as mudanças legislativas necessárias para que a Câmara entregue um resultado positivo e poder melhorar a qualidade de vida das pessoas, discutirmos os problemas que afligem hoje especialmente a população mais carente.

Na terça-feira, Lira atuou em duas frentes para cacifar Motta ao comando da Casa em fevereiro de 2025. Pela manhã, o atual presidente da Câmara anunciou publicamente o seu apoio à candidatura do aliado. O parlamentar também utilizou uma manobra regimental para retardar a tramitação da proposta que trata da anistia aos envolvidos no 8 de Janeiro. A intenção era que o tema não fosse utilizado como barganha pelo PL para apoiar um dos candidatos. Também abriu portas para o PT chancelar de uma vez o apoio a Motta, já que o parlamentar não precisaria se comprometer com a pauta agora.

Durante meses, Elmar Nascimento foi o favorito de Lira para sua sucessão, mas enfrentava resistências no Palácio do Planalto. O deputado do União tem um histórico de oposição ao PT na Bahia. Já Motta viabilizou sua candidatura após o presidente de seu partido, o deputado Marcos Pereira (SP), desistir da disputa por falta de apoio.

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